Eles se amam, mas é um amor com bordas claras. Um amor que aprendeu a existir dentro de contornos definidos, respeitando espaços que não são compartilhados. São um casal moderno, dizem. Mas no fundo, o que são? Dois universos que orbitam próximos, conscientes de que cada um tem sua própria órbita. Encontram-se, sim, mas sem invadir. Tocam-se, mas sem ultrapassar. Há algo de novo nisso? Talvez não. Talvez seja apenas o amor finalmente aprendendo a se respeitar.
Ela acorda antes, sempre, e prefere o silêncio da manhã. O café é solitário, o jornal aberto em páginas que ele raramente lê. Ela gosta desse tempo consigo mesma, é quando organiza o mundo interior, prepara-se para o dia. Ele entende isso, não se ofende. Fica na cama mais um pouco, pensando na vida que eles têm juntos. Ele sabe que, ao levantar, ela já estará imersa em seus próprios pensamentos, e que a conversa só virá mais tarde, quando o sol estiver mais alto. E isso não é um problema.
Há um pacto invisível entre os dois, uma espécie de acordo tácito. Cada um tem o seu espaço, não só físico, mas mental. Não precisam se misturar o tempo todo para se sentirem conectados. Ela lê sozinha no sofá enquanto ele assiste a um filme no quarto. Ele sai para correr ao entardecer enquanto ela prefere ficar em casa, observando o céu mudar de cor. Mas o silêncio entre eles nunca é vazio – é apenas o espaço necessário para que possam existir, inteiros, dentro e fora da relação.
No começo, achavam que isso era um problema. Onde estava a fusão completa que tantos falavam? O amor não deveria ser uma constante mistura de almas? Mas com o tempo, perceberam que a intensidade pode existir na distância. Que o amor, para ser pleno, precisa de ar para respirar. E que, paradoxalmente, o espaço entre eles era o que os mantinha juntos.
Às vezes, ela sente falta de uma presença mais constante, mas não diz nada. Porque sabe que ele precisa desse afastamento ocasional, desse mergulho em si mesmo. E ele, por sua vez, sente o desejo de estar mais perto, mas respeita a solitude dela, como se cada um deles soubesse exatamente onde termina o seu próprio território. E, curiosamente, é nesse respeito que o encontro acontece.
Quando finalmente se reúnem, depois de horas de distâncias sutis, é como se trouxessem consigo o frescor do mundo que exploraram sozinhos. Ela fala sobre o livro que leu, ele descreve o que sentiu durante a corrida. Eles compartilham o que há de novo em cada um, e nessa troca se renovam. Não há cobrança, apenas um interesse genuíno pelo que o outro viveu enquanto estavam separados.
Esse amor moderno, dizem, é frio. Mas não é frieza o que eles têm. É uma maturidade que aprendeu a equilibrar o desejo de proximidade com a necessidade de se preservar. O amor deles não é feito de excessos, mas de uma medida exata. Como uma dança em que cada passo respeita o ritmo do outro. Sabem que não precisam estar o tempo todo juntos para estarem em sintonia.
No fundo, o que eles têm é uma certeza tranquila de que podem ser quem são, completos, sem a obrigação de se moldarem um ao outro. Ele é inteiro, ela também, e juntos são mais. Mas nunca ao custo de apagar as fronteiras que os definem. E é nessa fronteira, nesse espaço livre entre dois mundos, que o amor deles floresce.
Porque, no fim das contas, eles entenderam que amar não é se perder no outro, mas se encontrar em si mesmo e, ainda assim, escolher estar ao lado. Não por necessidade, mas por desejo. Um amor que aprendeu a se amar antes de amar o outro. E é nesse equilíbrio delicado que o casal moderno encontra sua paz – na distância medida, no silêncio respeitado, no encontro que só é pleno porque não sufoca.
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