Enquanto me pego perdido, buscando por fragmentos que me levem novamente a quem um dia fui, percebo que talvez não haja mais volta. O eu de antes, que habita nas sombras das memórias, se tornou como fumaça. Quanto mais tento segurá-lo, mais ele escapa, dissolvendo-se no ar diante de mim. Parece que sou como uma árvore que perde suas folhas, mas, ao contrário do ciclo natural, essas folhas não voltam. Elas caem para sempre, e a cada nova estação sou menos daquilo que fui.
Caminho pela vida como quem tenta seguir as pegadas na areia, mas uma maré invisível vem e apaga tudo. O caminho que antes parecia claro se dissolveu, e agora só há terra molhada, sem vestígios. O que sou agora parece não se conectar com o que fui, como se fossem corpos celestes que orbitam longe demais para se atraírem. Me vejo como um rio que mudou seu curso tantas vezes que não lembra mais de onde veio, apenas segue, sem ter certeza de qual destino está traçado.
E então, no meio dessa correnteza interna, percebo que talvez minha confusão seja parte da natureza de ser. Sou feito de camadas, como uma casa que foi pintada tantas vezes que suas cores originais são irreconhecíveis. Tento raspar as camadas de tinta, mas descubro que, ao invés de voltar ao que era, crio novas nuances, novas misturas que não existiam antes. Não sou feito para ser desvendado, sou feito para ser construído e reconstruído, em infinitas versões.
Se antes eu pensava que deveria retornar a algo, agora vejo que sou um barco à deriva, mas talvez a deriva seja o único curso verdadeiro. Não há uma única rota, não há um destino fixo. E quem eu fui, assim como as folhas caídas e as pegadas apagadas, não está perdido. Está apenas transformado em algo que não posso mais ser, mas que vive nas raízes invisíveis de quem sou agora.
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